sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

 

TEXTO I  -  Crônica: Complô  

                                                                  Luís Fernando Veríssimo

        Mal chegou no céu, o gaúcho pediu para falar com Deus. Queria fazer uma queixa. Deus estava em reunião e o gaúcho foi encaminhado a São Pedro. São Pedro estava na sala de comando meteorológico. Era ali, cercado por sua equipe à frente de painéis sofisticadíssimos, que São Pedro dirigia o tempo do mundo.

        ― O que é? Disse São Pedro, sem olhar para o gaúcho. Prestava atenção numa tela à sua frente.

        ― Estão contra nós ― queixou-se o gaúcho.

        ― Quem?

        ― Todo mundo.

        ― Bobagem.

        ― Verdade. Veja só o que tem nos acontecido.

        E, seguindo São Pedro pela sala enquanto este ajustava controles e checava mostradores, o gaúcho contou tudo que tinha feito ao Rio Grande do Sul nos últimos tempos. Tudo. Concluiu dizendo que aquilo só podia ser uma campanha organizada. Um complô contra o Rio Grande!

        ― Paranoia ― sentenciou São Pedro.

        ― Fazem pouco de nós. Nós... Mas São Pedro o interrompeu com um gesto. Apontou para uma tela.  ― Veja. Por coincidência, vamos programar o tempo no Rio Grande do Sul para as próximas horas.  E São Pedro passou a dar ordens a seus comandados.

        ― Grandes nuvens negras!

        ― Grandes nuvens negras ― confirmou o encarregado do setor.

        ― Relâmpagos espetaculares.

        ― Relâmpagos espetaculares.

        ― Trovões retumbantes!

        ― Trovões retumbantes.

        O gaúcho entusiasmado chegou a ficar na ponta dos pés, de tão ansioso, esperando a ordem final de São Pedro. ― E atenção ― disse São Pedro.

        Todos esperavam a ordem. São Pedro fechou os olhos, como que buscando inspiração, e ficou assim por uns instantes. Depois decretou:  ― Chuviscos.

        Houve risadas generalizadas da equipe.

        Quando saía da sala, o gaúcho viu, com o rabo dos olhos, São Pedro tapar a boca para não rir também. O complô era mais amplo do que se imaginava.

VERISSIMO, L. F. Mais comédias para ler na escola. Rio de Janeiro: Objetiva, 2020. p. 73 – 74.

Fonte: Maxi: Séries Finais. Caderno 1. Língua Portuguesa – 7º ano. 1.ed. São Paulo: Somos Sistemas de Ensino, 2021. Ensino Fundamental 2. p. 08 – 09.

 

                                                 Entendendo a crônica:

01 – Qual a principal queixa do gaúcho ao chegar ao céu?

      A principal queixa do gaúcho é que existe um complô contra o Rio Grande do Sul, pois as condições climáticas adversas que têm atingido o estado são, em sua opinião, intencionais e não mera obra do acaso. Ele acredita que há uma força externa agindo contra o estado.

02 – Qual a reação inicial de São Pedro à queixa do gaúcho?

      Inicialmente, São Pedro demonstra descaso e até mesmo certa irritação com a queixa do gaúcho, atribuindo suas alegações à paranoia. Ele atribui as condições climáticas a eventos naturais e aleatórios, negando a existência de qualquer complô.

03 – Como São Pedro tenta convencer o gaúcho de que não há nenhum complô?

      Para demonstrar ao gaúcho que não há nenhum complô, São Pedro o convida a acompanhar o processo de programação do clima para o Rio Grande do Sul. Ele mostra como as decisões sobre as condições climáticas são tomadas de forma aparentemente aleatória e não com a intenção de prejudicar o estado.

04 – Qual a reação do gaúcho ao ver como São Pedro programa o clima?

      Inicialmente, o gaúcho fica entusiasmado com a ideia de que São Pedro poderia finalmente proporcionar um clima favorável ao Rio Grande do Sul. No entanto, ao ouvir a ordem final de São Pedro por "chuviscos", ele se decepciona e percebe que o complô parece ser ainda mais amplo do que imaginava.

05 – Qual a ironia presente na crônica?

      A ironia da crônica reside no fato de que o gaúcho, ao buscar uma explicação para as adversidades que o Rio Grande do Sul enfrenta, atribui tudo a um complô. No entanto, a verdade é ainda mais simples e banal: as condições climáticas são resultado de processos naturais e das decisões, muitas vezes arbitrárias, de São Pedro. A crônica satiriza a tendência humana de buscar explicações complexas para eventos simples e de acreditar em conspirações.

06 – Qual a mensagem principal da crônica?

      A mensagem principal da crônica é que, muitas vezes, atribuímos intenções maldosas e conspirações a eventos que são, na verdade, resultado do acaso ou de decisões arbitrárias. A crônica nos convida a questionar nossas próprias crenças e a não buscar culpados para todos os problemas que enfrentamos.

07 – Qual o papel do humor na crônica?

      O humor desempenha um papel fundamental na crônica, tornando a leitura mais leve e agradável. A situação absurda do gaúcho que acredita em um complô climático e a reação irônica de São Pedro geram um efeito cômico que ajuda a transmitir a mensagem da crônica de forma mais eficaz. O humor também serve para criticar a tendência humana de buscar explicações conspiratórias para os eventos do mundo.

                                       TEXTO II Crônica: Taboão dos Palmares         Sérgio Vaz

        Taboão da Serra é uma cidade de mil faces e não há como decifrá-las sem devorá-las. Impossível pensá-la sem suas ladeiras, seus becos e suas vielas. Cada quebrada é um município no meu estado de espírito. As calçadas são irregulares, por isso, nossa gente anda no meio da rua, desafiando a arrogância dos carros, buzina pra você ver…        Uma das faces mais bonitas da cidade é a nossa gente, e da nossa gente, umas das faces mais bonitas é a do João Barraqueiro, da Kika e da sua família. Gente da pele preta que tem o suor como marca registrada no rosto.

        Não importa o evento, nem o local, é lá que eles estão. É comum vê-los nas Praças, campos de futebol, shows, favela, comícios, etc. desfilando a grandeza dos que não se entregam, e se recusam a ser escravos do parasitismo.A barraca é o Quilombo dos Palmares dessa família, tamanha liberdade com que constroem o pão de cada dia. Da mesma barraca lutam como quem faz uma prece ao céu, ou a terra, adorando um deus chamado dignidade.

        A coragem que exalam das mãos é de assustar qualquer senhor de engenho ou capitão do mato. Trazem no olhar o desprezo pela chibata, e no coração, o fogo brando que aquece o caldeirão da liberdade. Valeu Zumbi! Com todo o respeito às ancestralidades, que a mãe África me perdoe, mesmo, mas mãe é aquela que cria, o João e a Kika são filhos de Taboão da serra, e não por acaso são nossos irmãos. Axé!  

        Para aqueles que acreditam que o caráter independe da cor, uma poesia:

        “Que a pele escura não seja escudo para os covardes que habitam na senzala do silêncio.

        Porque nascer negro é consequência, ser é consciência”.

                                                                  Entendendo a crônica:

01 – Qual é o tema principal da crônica "Taboão dos Palmares"?

      O tema principal é a celebração da comunidade de Taboão da Serra, especialmente a resistência, dignidade e força das pessoas negras que habitam o local, simbolizados na figura de João Barraqueiro, Kika e sua família.

02 – Como Sérgio Vaz descreve a cidade de Taboão da Serra na crônica?

      Sérgio Vaz descreve Taboão da Serra como uma cidade de "mil faces", com ladeiras, becos e vielas que moldam o estado de espírito dos moradores. Ele ressalta a irregularidade das calçadas e a coragem das pessoas que andam no meio da rua, desafiando os carros.

03 – Quem são João Barraqueiro e Kika na crônica, e o que eles representam?

      João Barraqueiro e Kika são descritos como pessoas de pele preta, trabalhadores que sustentam sua família com dignidade. Eles representam a resistência, a força e a liberdade, sendo comparados a figuras de um quilombo, como o de Palmares.

04 – O que a barraca de João Barraqueiro e Kika simboliza na crônica?

      A barraca é simbolizada como um "Quilombo dos Palmares", um espaço de liberdade e resistência onde a família luta para garantir o sustento diário com dignidade e coragem, enfrentando as dificuldades da vida.

05 – Qual é a visão do autor sobre a relação entre cor da pele e caráter?

      O autor defende que o caráter não depende da cor da pele. Ele sugere que ser negro vai além de uma condição biológica; é uma questão de consciência e postura diante da vida.

06 – Que elementos da crônica mostram a valorização da ancestralidade africana?

      A crônica faz referência a figuras históricas de resistência, como Zumbi dos Palmares, e reverencia a mãe África. Apesar disso, o autor também reconhece que João e Kika são "filhos de Taboão da Serra", valorizando suas raízes e identidade locais.

07 – Qual mensagem a poesia no final da crônica transmite?

      A poesia no final da crônica transmite uma mensagem de resistência e orgulho negro. Ela destaca que a pele escura não deve ser usada como um escudo para a covardia, mas sim ser carregada com consciência e orgulho.

 

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