TEXTO I - Crônica: Complô
Luís Fernando Veríssimo
Mal chegou no céu, o
gaúcho pediu para falar com Deus. Queria fazer uma queixa. Deus estava em
reunião e o gaúcho foi encaminhado a São Pedro. São Pedro estava na sala de
comando meteorológico. Era ali, cercado por sua equipe à frente de painéis
sofisticadíssimos, que São Pedro dirigia o tempo do mundo.
― O que é? Disse São
Pedro, sem olhar para o gaúcho. Prestava atenção numa tela à sua frente.
― Estão contra nós ―
queixou-se o gaúcho.
― Quem?
― Todo mundo.
― Bobagem.
― Verdade. Veja só o que
tem nos acontecido.
E, seguindo São Pedro
pela sala enquanto este ajustava controles e checava mostradores, o gaúcho
contou tudo que tinha feito ao Rio Grande do Sul nos últimos tempos. Tudo.
Concluiu dizendo que aquilo só podia ser uma campanha organizada. Um complô
contra o Rio Grande!
― Paranoia ― sentenciou
São Pedro.
― Fazem pouco de nós.
Nós... Mas São Pedro o interrompeu com um gesto. Apontou para uma tela. ―
Veja. Por coincidência, vamos programar o tempo no Rio Grande do Sul para as
próximas horas. E São Pedro passou a dar
ordens a seus comandados.
― Grandes nuvens negras!
― Grandes nuvens negras
― confirmou o encarregado do setor.
― Relâmpagos
espetaculares.
― Relâmpagos
espetaculares.
― Trovões retumbantes!
― Trovões retumbantes.
O gaúcho entusiasmado
chegou a ficar na ponta dos pés, de tão ansioso, esperando a ordem final de São
Pedro. ― E atenção ― disse São Pedro.
Todos esperavam a ordem.
São Pedro fechou os olhos, como que buscando inspiração, e ficou assim por uns
instantes. Depois decretou: ― Chuviscos.
Houve risadas
generalizadas da equipe.
Quando saía da sala, o
gaúcho viu, com o rabo dos olhos, São Pedro tapar a boca para não rir também. O
complô era mais amplo do que se imaginava.
VERISSIMO, L.
F. Mais comédias para ler na escola. Rio de Janeiro: Objetiva, 2020.
p. 73 – 74.
Fonte: Maxi: Séries
Finais. Caderno 1. Língua Portuguesa – 7º ano. 1.ed. São Paulo: Somos Sistemas
de Ensino, 2021. Ensino Fundamental 2. p. 08 – 09.
Entendendo a crônica:
01 – Qual a principal queixa do gaúcho ao chegar ao céu?
A principal queixa do gaúcho é que existe
um complô contra o Rio Grande do Sul, pois as condições climáticas adversas que
têm atingido o estado são, em sua opinião, intencionais e não mera obra do
acaso. Ele acredita que há uma força externa agindo contra o estado.
02 – Qual a reação inicial de São Pedro à queixa do gaúcho?
Inicialmente, São Pedro demonstra descaso
e até mesmo certa irritação com a queixa do gaúcho, atribuindo suas alegações à
paranoia. Ele atribui as condições climáticas a eventos naturais e aleatórios,
negando a existência de qualquer complô.
03 – Como São Pedro tenta convencer o gaúcho de que não há nenhum
complô?
Para
demonstrar ao gaúcho que não há nenhum complô, São Pedro o convida a acompanhar
o processo de programação do clima para o Rio Grande do Sul. Ele mostra como as
decisões sobre as condições climáticas são tomadas de forma aparentemente
aleatória e não com a intenção de prejudicar o estado.
04 – Qual a reação do gaúcho ao ver como São Pedro programa o clima?
Inicialmente, o gaúcho fica entusiasmado
com a ideia de que São Pedro poderia finalmente proporcionar um clima favorável
ao Rio Grande do Sul. No entanto, ao ouvir a ordem final de São Pedro por
"chuviscos", ele se decepciona e percebe que o complô parece ser
ainda mais amplo do que imaginava.
05 – Qual a ironia presente na crônica?
A ironia da crônica reside no fato de que
o gaúcho, ao buscar uma explicação para as adversidades que o Rio Grande do Sul
enfrenta, atribui tudo a um complô. No entanto, a verdade é ainda mais simples
e banal: as condições climáticas são resultado de processos naturais e das decisões,
muitas vezes arbitrárias, de São Pedro. A crônica satiriza a tendência humana
de buscar explicações complexas para eventos simples e de acreditar em
conspirações.
06 – Qual a mensagem principal da crônica?
A mensagem principal da crônica é que, muitas
vezes, atribuímos intenções maldosas e conspirações a eventos que são, na
verdade, resultado do acaso ou de decisões arbitrárias. A crônica nos convida a
questionar nossas próprias crenças e a não buscar culpados para todos os
problemas que enfrentamos.
07 – Qual o papel do humor na crônica?
O humor desempenha um papel fundamental
na crônica, tornando a leitura mais leve e agradável. A situação absurda do
gaúcho que acredita em um complô climático e a reação irônica de São Pedro
geram um efeito cômico que ajuda a transmitir a mensagem da crônica de forma
mais eficaz. O humor também serve para criticar a tendência humana de buscar
explicações conspiratórias para os eventos do mundo.
TEXTO II Crônica: Taboão dos Palmares Sérgio Vaz
Taboão da Serra é uma
cidade de mil faces e não há como decifrá-las sem devorá-las. Impossível
pensá-la sem suas ladeiras, seus becos e suas vielas. Cada quebrada é um
município no meu estado de espírito. As calçadas são irregulares, por isso,
nossa gente anda no meio da rua, desafiando a arrogância dos carros, buzina pra
você ver… Uma das faces mais
bonitas da cidade é a nossa gente, e da nossa gente, umas das faces mais
bonitas é a do João Barraqueiro, da Kika e da sua família. Gente da pele preta
que tem o suor como marca registrada no rosto.
Não importa o evento,
nem o local, é lá que eles estão. É comum vê-los nas Praças, campos de futebol,
shows, favela, comícios, etc. desfilando a grandeza dos que não se entregam, e
se recusam a ser escravos do parasitismo.A barraca é o Quilombo dos Palmares
dessa família, tamanha liberdade com que constroem o pão de cada dia. Da mesma
barraca lutam como quem faz uma prece ao céu, ou a terra, adorando um deus chamado
dignidade.
A coragem que exalam das
mãos é de assustar qualquer senhor de engenho ou capitão do mato. Trazem no
olhar o desprezo pela chibata, e no coração, o fogo brando que aquece o
caldeirão da liberdade. Valeu Zumbi! Com todo o respeito às ancestralidades,
que a mãe África me perdoe, mesmo, mas mãe é aquela que cria, o João e a Kika
são filhos de Taboão da serra, e não por acaso são nossos irmãos.
Axé!
Para aqueles que
acreditam que o caráter independe da cor, uma poesia:
“Que a pele escura não
seja escudo para os covardes que habitam na senzala do silêncio.
Porque nascer negro é
consequência, ser é consciência”.
Entendendo a crônica:
01 – Qual é o tema principal da crônica "Taboão dos Palmares"?
O tema principal é a celebração da
comunidade de Taboão da Serra, especialmente a resistência, dignidade e força
das pessoas negras que habitam o local, simbolizados na figura de João
Barraqueiro, Kika e sua família.
02 – Como Sérgio Vaz descreve a cidade de Taboão da Serra na crônica?
Sérgio Vaz descreve Taboão da Serra como
uma cidade de "mil faces", com ladeiras, becos e vielas que moldam o
estado de espírito dos moradores. Ele ressalta a irregularidade das calçadas e
a coragem das pessoas que andam no meio da rua, desafiando os carros.
03 – Quem são João Barraqueiro e Kika na crônica, e o que eles
representam?
João Barraqueiro e Kika são descritos
como pessoas de pele preta, trabalhadores que sustentam sua família com
dignidade. Eles representam a resistência, a força e a liberdade, sendo
comparados a figuras de um quilombo, como o de Palmares.
04 – O que a barraca de João Barraqueiro e Kika simboliza na crônica?
A barraca é simbolizada como um
"Quilombo dos Palmares", um espaço de liberdade e resistência onde a
família luta para garantir o sustento diário com dignidade e coragem,
enfrentando as dificuldades da vida.
05 – Qual é a visão do autor sobre a relação entre cor da pele e
caráter?
O
autor defende que o caráter não depende da cor da pele. Ele sugere que ser
negro vai além de uma condição biológica; é uma questão de consciência e
postura diante da vida.
06 – Que elementos da crônica mostram a valorização da ancestralidade
africana?
A crônica faz referência a figuras
históricas de resistência, como Zumbi dos Palmares, e reverencia a mãe África.
Apesar disso, o autor também reconhece que João e Kika são "filhos de
Taboão da Serra", valorizando suas raízes e identidade locais.
07 – Qual mensagem a poesia no final da crônica transmite?
A poesia no final da crônica transmite
uma mensagem de resistência e orgulho negro. Ela destaca que a pele escura não
deve ser usada como um escudo para a covardia, mas sim ser carregada com
consciência e orgulho.
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